Acho que foi em Junho de 69.
Um frio lascado. Antes de começar as aulas daquela noite tive uma idéia. Fazer uma vaquinha e comprar uma garrafa de pinga, alguns limões e fazer uma caipirinha para todos se aquecerem na hora da saída, contra o frio, é lógico.
Arrecadei o dinheiro, pulei o muro, e fui até o bar da esquina comprar a pinga e o limão.
Lá no bar mesmo, dentro do litro foi preparada a caipirinha. Pulei de volta o muro com o litro em debaixo do paletó (naquele tempo, os alunos da noite tinham que usar paleto). Guardei a garrafa em baixo da minha carteira. O problema é que no intervalo, alguns mais afoitos, ou com mais frio foram na minha carteira e distribuiram para todos, no gargalo mesmo.
Quando voltamos para a classe, todos estavam muito alegres. Mas como sempre, na classe existiam alguns alunos que ficavam abismados com algumas atitudes dos outros, e provavelmente nos entregaram.
Quando reiniciou a aula logo após o intervalo, era uma prova de Geografia. Batem na porta. Quando ela é aberta, Sr. Colombo e outro bedel comunicam à professora que alguns alunos precisam acompanha-los até a Diretoria (Dr. Telemaco). Eu na hora, nem começei a prova. Coloquei minha caneta na carteira e fiquei esperando meu nome ser chamado. Fomos em cinco para a Diretoria. Chegando lá o Dr. Telemaco (vermelho como um pimentão) foi perguntando o nome de cada um dos santinhos. Eu fui o segundo a ser perguntado. Ele pegou um fichario do lado da mesa e conforme sabia o nome de cada um, tirava uma ficha. No meu caso ele disse: O senhor fica de lado, que hoje liquido com o senhor. Deu tres dias de suspensão para cada um, e mandou sairem da sala, e fecharem a porta. Primeiro disse que eu seria suspenso por 15 dias, por ter saido da escola sem autorização, ter trazido objeto estranho à aula,.....e mais um monte de alegações. Depois perguntou o que eu fazia. Começei a explicar a ele que trabalhava de dia para ajudar maus pais a criarem meus outros 7 irmãos menores, que meu pai dependia de minha ajuda para sobreviver, que meu pai trabalhava duro todos os dias num banco, etc. Acho que acabei comovendo o homem, que até ficou um pouco menos vermelho. Então ele virou para mim e falou: Vamos fazer um trato? Eu lhe dou somente 3 dias de suspensão, mas o senhor irá prometer que nem em frente do corredor o senhor não mais passará até o final do ano. Se passar em frente da Diretoria o senhor será expulso na hora. Aceitei de imediato o acordo. Na segunda feira seguinte tinha um jogo de futebol de salão no Alberto Krun. A classe inteira largou a aula e foi assistir o jogo. No meio do jogo apareceu um dos bedéis. Não tive jeito. Nem voltei para a classe e nem mais ao Culto a Ciência, pois ele iria cumprir o que tinha falado. Seria expulso na hora. Foi até divertido, mas lamentei muito ter saído de lá. Sempre mantive o emblema daquele colégio preso ao braço, e tinha o maior orgulho de falar que lá estudava, e até hoje, como qualquer aluno que lá estudou deve se orgulhar.

Alcino Pascoal Reis - Período Noturno, 1969