Quem teve o privilégio de estudar no Culto à
Ciência, tem sem dúvida na memória recordações maravilhosas e um sem número
de causos para contar aos amigos, filhos e netos. Dos
inúmeros, que vivi, um dos mais interessantes remonta ao tempo em que fazia o
3. º colegial, noturno, no ano de 1976, o que por si só já era um
“happening”, afinal era o ano do cursinho e último no colégio. A turma do
diurno ia na sua grande maioria para o período noturno para poder fazer o
cursinho no Objetivo na parte da manhã. O encontro entre as duas turmas não
era das mais amistosas, pois os do diurno eram considerados os filhinhos de
papai “burgueses” e os da noite eram os trabalhadores. Essa situação durou
pouco tempo, logo, com raras exceções todos estavam inseridos no clima da
bagunça, das brincadeiras e do clima amistoso que reinou por todo o resto do
ano. Como
nessa época as festas às sextas-feiras fervilhavam pela cidade, precisávamos
achar uma maneira de comparecer as mesmas sem ficar com falta. Alguém teve a
brilhante idéia de desligar a chave geral da energia elétrica numa
sexta-feira, para que as aulas fossem suspensas. Idéia aceita, deu-se início a
elaboração do plano e constatamos:
1.
º como abrir os enormes cadeados, que fechavam as portas dos relógios?
2.
º existiam mais ou menos 10 quadros de distribuição, qual seria o geral?
3. º como executar a empreitada?
Para
solucionar a 1. ª indagação, após várias e demoradas reuniões informais
entre os “cabeças”, concluíram que por tratar-se de cadeados muito
antigos, seria fácil abri-los com um pedaço de arame ou um grampo de cabelo.
Assim, sorrateiramente, durante os intervalos das aulas e por vários dias
tentou-se, até que o intento foi conseguido, passando-se a execução da
segunda parte do plano, que consistia em descobrir o relógio certo, aquele que
continha a chave geral. Cada dia abria-se um cadeado e desligava-se o relógio
até que descobrimos o que nos interessava. Feito isso, passamos a cronometrar o
tempo que o bedel levava até buscar a lanterna, as chaves dos cadeados que
ficavam na diretoria e religar o relógio. Bastava
agora ultimar os detalhes, tais como o dia e fazer uma “vaquinha” para
adquirir um cadeado de boa qualidade, tipo Papaiz. Nos
dias que se seguiram os pontos pendentes foram sanados, o cadeado foi adquirido
e a data foi escolhida. A operação toda só era de conhecimento dos cabeças,
haja vista que nem todos da sala eram confiáveis, pois a corrente dos
“CDFS” queriam nos ver pelas costas. Finalmente,
chegou o grande dia, tudo acertado, nós evidentemente com a roupa típica de
festa daquela época, calça New Man ou Staroup ou Gledson, sapato da TOP’S,
etc... Na
hora do intervalo, ás 21 horas em ponto, o alemão que não era o Hoffmann e
sim um rapaz que vinha de Indaituba, que trabalhava na roça, mas que se
enturmou perfeitamente conosco e como ninguém entendeu o espírito da coisa,
mas que infelizmente não me lembro agora do nome, foi com o reluzente Papaiz até
o relógio de luz, sob olhar apreensivo de toda a cúpula, sacou o cadeado
velho, abriu a porta de flandres, desativou a antiga chave faca fechando
rapidamente a porta e lacrando-a com o cadeado novo. Após
exatos cinco minutos e sob a vaia de todos que estavam no pátio surge o seo
Colombo com um enorme molho de chaves numa mão e uma lanterna na outra e
caminhando rapidamente se dirige aos padrões de energia elétrica. Tentou a
primeira chave, tentou a segunda, depois outra e mais outra até que percebeu
que o cadeado havia sido trocado; desiste e retorna à administração. Passados
mais alguns minutos, seo Colombo reaparece com um antigo megafone e anuncia em
tom melancólico que as aulas estavam suspensas naquela sexta-feira. Resultado
final de meses de planejamento: fomos todos para a balada, como se diz hoje em
dia.
Sérgio Rabello de Almeida, Período Noturno, 1976