Exmo. Sr.
A
Na mesma sala em que hoje seus membros se reúnem, sentaram-se, através
dos tempos, para tratar de assuntos pedagógicos e culturais, professores dos
mais ilustres do Brasil, como Perez y Marin, Otoniel Mota, Carlos Francisco de
Paula, Aníbal de Freitas, Benedito Sampaio, Ernesto Kuhlmann. Esse amor que
devotaram às ciências e às letras é ponto de honra , para nós, cultivar.
Pois devemos e queremos respeitar essa tradição de Magistério.
Nós não queremos ser educadores sem memória, que pretendamos
blasonar-nos de desenraizados; que, fingindo-nos de distraídos, admitamos
esquecer o nosso passado. Lembrá-lo sempre e respeitá-lo não significa
continuísmo vazio, Senhor Secretário. Porque história e tradição nunca
foram sinônimos, como alguns, por detratores, querem entender, de caruncho e
velharia. História e tradição nunca foram obstáculos à atualização, a
trabalho sério, a idealismo.
Desprezar o passado não é receita digna para quem tem como meta um
trabalho consciente no presente e um anseio de preservá-lo no futuro. Se assim
fosse, o nosso estado de São Paulo, para crescer, teria que perder a memória e
esquecer-se dos que abriram os primeiros caminhos, como se jamais tivessem
palmilhado o seu chão os bandeirantes.
Nós somos lúcidos, Senhor Secretário. E não estamos defendendo as
paredes vetustas do “Culto à Ciência”. Não defendemos o monumento,
enquanto pedra e cal. Amamos o espírito que habita entre essas paredes. Somos
capazes de beijar, sim, o chão que os nossos antepassados aqui pisaram, porque
eles também foram bandeirantes, os bandeirantes da cultura, do amor às letras
e às ciências. São os nossos ascendentes no magistério, nós somos sua progênie.
Mas não permitimos que se criem confusões. Nunca descansamos sobre os
louros do passado. Vivemos o nosso tempo, somos lúcidos. Podemos divulgar a
nossa formação, o nosso trabalho, a nossa atualização. Podemos expender tudo
o que temos construído.
Neste momento, não cabe modéstia, Senhor Secretário, porque há os que
têm pretendido ver em nosso Colégio só o monumento do passado. Nós
existimos, somos a Congregação do “Culto à Ciência”. Somos os
professores do hoje, que escolhemos o nosso caminho livremente e por isso o
amamos. Temos inteira consciência do nosso dever de educadores e o temos
cumprido.
Vossa Excelência encontrará, entre nós, os que são pós-graduados; os
que têm obras publicadas; os que têm cursos de especialização em
universidades estrangeiras; os que conquistaram belas classificações em
concursos de ingresso ao magistério, mesmo primeiros lugares; os que elaboraram
teses e prestaram provas em concurso interno, para cadeiras do próprio “Culto
à Ciência”, perante bancas constituídas por autoridades do ensino universitário
paulista. Vossa Excelência encontrará os que contribuem para o desenvolvimento
da tecnologia; de um de nós nasceu a partitura, que ficou sendo, por concurso,
o Hino do Centenário de Campinas. Dentre nós há os que preparam os alunos que
têm vencido maratonas intelectuais de Português e de Matemática, bem como
importantes competições esportivas.
Tudo isso são sementes que germinam, porque nós queremos ser quais
novos semeadores, que preparam o solo com desvelo, afastando urzes e pedras. E
é isso que queremos continuar a ser, é só isso, Senhor Secretário. Temos
necessidade de plantar e de colher, de ver o fruto de nosso trabalho. Temos
necessidade de desafiar-nos, a nós próprios, para ver o de que somos capazes.
Não podemos assistir, mudos, a que nos despojem da própria essência de
nosso trabalho, do barro que se pode modelar, do barro que vivifica. Não
podemos ser mercenários. A nós não é indiferente a redução a que nos
condenam. Não nos agrada trabalhar como operários especializados, a quem
apenas cabe uma breve etapa na
fabricação de uma fria peça. Nós, não! Nós trabalhamos com material
humano. Queremos ver aquilo que estamos criando. Amamos os nossos alunos.
Queremos trabalhar com eles como quem esculpe, como quem plasma. Não
queremos apenas alunos em trânsito. Que tempo poderemos ter, se nos restarem só
alunos de fim de curso, arribados de outras escolas?
Por essas razões, pedimos a Vossa Excelência conserve o primeiro grau
do “Culto à Ciência”, para que o nosso Colégio não se desfigure,
continue a espelhar o Ginásio de outrora, continue a honrar o seu passado.
Amplie as nossas incumbências, sempre que houver por bem. Não as
mutile. Rogamos a Vossa Excelência ouça a nossa voz. E, se bem atentar, sentirá
que ela não é só nossa. A ela se somam as vozes das primícias, as vozes que
ressoaram _ e que nos falam ainda, num milagre de amor _ por estas salas de
aula, pelos corredores e pelos pátios, de todos os que, antes de nós,
dedicaram a melhor parte de suas vidas ao “Culto à Ciência”. Mesmo que,
por omissão e comodismo, nos calássemos, quem seria capaz de silenciar essas
outras vozes dos que nos legaram o magistério?
A Congregação do Colégio Estadual “Culto à Ciência” agora se
pronuncia. Já se divulgou que quatro colégios campineiros, irmãos que
respeitamos, tiveram mantidos primeiro e segundo graus. Nós rogamos a Vossa
Excelência que, equânime, mantenha primeiro e segundo graus em nosso colégio.
Pedimos que considere o nosso pronunciamento, a que nos dá direito a nossa
autonomia.
Nada tem a ver com nossos anseios a incrustação de um ginásio
estranho, com outro nome e sob outra direção, dentro de nossos muros. Abrimos
mão dessa oferta que nos fazem. Não queremos compensações.
Queremos,
sim, que esse prédio novo mantenha o nome de “Culto à Ciência” e se
integre, não só no seu terreno, não só materialmente, mas na própria alma
do “Culto à Ciência”, como reconhecimento do passado, como resposta aos
anseios do presente, para orgulho de toda Campinas.
Contamos com Vossa Excelência.
Em nome da Congregação,
Joaquina Elisa R. S. de Melo Serrano
Campinas,
1975
© Carlos Francisco
Paula Neto - última atualização em
21/09/2018
e-mail :
carlospaula@cultoaciencia.net