Às vezes, porque teríamos chamada na aula do professor Pedrinho, ou
porque estávamos com uma preguiça danada, resolvíamos, Carmen P. Moura,
Ângela Otranto Jorge e eu, matar aula e ir ao cinema. Mas como era impossível
assumir isto para nossos pais, inventávamos um esquema de “João Sem
Braço”: saíamos atrasadas de casa para chegar à escola com os portões já
fechados. Nosso caminho era pela Camargo Paes e quando estávamos perto do Clube
Nipo-Brasileiro, escutávamos o inconfundível barulho de uma DKW se aproximando
devagarinho e parando. Dona Auzenda, toda simpática, abria a porta do carro já
dizendo: “Ih meninas, vocês estão atrasadas...“ . O que fazer com tanta
gentileza? É claro que entrávamos no carro. E lá íamos nós naquele
DKWezinho abóbora desbotado que nunca soube o que era a terceira marcha.
Primeira: vrrumm...; segunda: vrruum... E quando o barulho já estava estourando
nossos tímpanos, dona Auzenda tirava o pé do acelerador e... pópópópópó...
E de novo: vrrrrruuumm, pópópópopó... Quando chegávamos ao portão do
Alberto Krun, ela mostrava uma destreza incomum: sem reduzir a velocidade,
mirava o portão e entrava a toda... Pronto, lá estávamos dentro do colégio,
com os olhos esbugalhados e o coração batendo a mil -- adeus “sessão da
tarde”. Graças a dona Auzenda, tirei algumas notas baixas nas chamadas do
professor Pedrinho, mas muito mais que isso, graças a ela, até hoje gosto
muito de Matemática.